Páginas

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Caminhos evolutivos da MPB, em livro a ser lançado.

 A bossa nova já havia feito a revolução e pavimentado o caminho para a geração de Chico Buarque, Edu Lobo, Elis Regina. Parecia que a música popular brasileira seguiria sem acidentes por aquela trilha - a herança de sofisticação samba-impressionismo-jazz fundada pela bossa. Até que, no Festival da Record de 1967, com guitarras e imagens poéticas embebidas da nascente cultura pop, Caetano Veloso e Gilberto Gil apresentaram "Alegria, alegria" e "Domingo no parque", plantando as bases do que seria a Tropicália e mudando para sempre a trajetória da MPB. Ou, como defende o jornalista Hugo Sukman em "Histórias paralelas: 50 anos de música brasileira" (Casa da Palavra), mudando para sempre uma das muitas trajetórias da MPB. No livro, ele propõe outras seis, que passam ao largo da chamada "linha evolutiva da MPB" - consagrado conceito criado por Caetano.

- A ideia da linha evolutiva é tão poderosa que domina as discussões sobre música brasileira - diz Sukman, que lança o livro dia 15, às 19h, na livraria Argumento do Leblon. - Ela tem a força de conceitos marxistas, usados até por não marxistas. Qualquer leitura da MPB passa por ali. Queria outro olhar.

O olhar de Sukman identifica, então, caminhos paralelos. Cada capítulo é dedicado a um deles: o samba, a MPB, a Tropicália; a Jovem Guarda e o brega; o instrumental; a música nordestina; a diversidade das cidades. Cada linha com suas revoluções próprias. Um exemplo é o surgimento de Martinho da Vila, numa linhagem que vem de Candeia e desagua no pagode - uma segunda corrente do samba viria de Paulinho da Viola e sua elegância herdeira da velha guarda. Outro exemplo é "Berimbau", de Baden Powell e Vinicius de Moraes, que instaura, diz ele, a separação entre a bossa e a MPB:

- "Berimbau", como os afro-sambas que viriam depois, reencena a criação da música brasileira. Parte de uma primeira parte modal, africana, e na segunda se torna tonal, acrescido da herança europeia. O afro-samba é tão vanguardista quanto o tropicalismo. E Milton, Edu, Chico, Paulinho e Hermeto são tão modernos quanto Caetano e Gil.

Livro ilumina cenas-chave

Mais que uma pesquisa exaustiva sobre cada uma das linhas, o livro ilumina certas cenas e dá a elas novos significados. O fato de Gil ter feito "Domingo no parque" numa madrugada, tendo Dorival Caymmi na cabeça e a filha dele, Nana, então sua mulher, na cama - o desejo de fazer uma nova canção baiana, num gesto de doce subversão contra o pai de sua companheira. Ou o "não" que o Quarteto Novo dá ao convite de arranjar a mesma "Domingo no parque" ao ouvir Gil citar Beatles como referência - um "não" que o autor vê como um marco para uma música instrumental que se desenvolveria a partir dali sem tomar conhecimento do pop ou do tropicalismo.

PAULINHO DA VIOLA: revolucionário na história do  samba/ Foto: reprodução

- Procuro jogar luz sobre fragmentos como a lista de músicas do disco de Elis de 1966, que trazia toda a geração que seria a MPB e que encerra com a única música que restava à cantora depois de apresentar aqueles nomes: "Carinhoso", a canção brasileira por excelência. Não é um livro de histórias novas, apesar de algumas serem, como a de Paulo César Pinheiro contando que viu Gil vaiando Chico Buarque (Caetano afirma que Gil defendia Chico) no Festival da Record de 1968 e pensou então em abandonar a música.

A tensão entre Chico e os tropicalistas está no livro, assim como a relação de espelhamento entre ele e Caetano - o segundo "perseguindo" o primeiro. "Alegria, alegria" e "A banda", "Você não entende nada" e "Com açúcar, com afeto", "Paratodos" e "Pra ninguém"...

- Chico é a perfeição - define Sukman. - O que Caetano faz com o tropicalismo é empreender uma mudança de gosto a favor dele. Se os padrões de qualidade se mantivessem em Chico, Dori, Jobim, Tamba Trio, como eram, ele não se tornaria tão importante. Mas é uma visão generosa também, pois traz o Brasil excluído, da cultura de massa, do brega. O projeto maior do tropicalismo, porém, era a atualização da música brasileira frente ao que se praticava no mundo. Sua realização maior, portanto, se deu no Rock in Rio de 1985, quando a música brasileira se mostra em pé de igualdade com a cena internacional.
fonte: oglobo

Nenhum comentário:

Postar um comentário